Belo Horizonte 10 de agosto de 2012
Relato de uma CEIA
Baseando-me em minha atividades artísticas fiz minha inscrição em mais um projeto de compartilhamento do CEIA, sendo que a mesa posta, como convite, versaria sobre a permeabilidade na arte contemporânea. Dois artistas foram convidados a coordenarem essa discussão, um que buscava na luz suas questões: Vaughn Sadie, sul africano; outra que buscava no caminho, das múltiplas possibilidades, de experimentações contemporâneas um meio de extravasar suas proposições: Otobong Nikanga, nigeriana de nascimento. Me inscrevi para a tutela da última, uma vez que, nesse momento de inscrição, senti maior afinidade com o seu fazer.
Após a expectativa da seleção a ansiedade de vivenciar esse período de troca pairava sobre mim, afinal no Brasil, mais especificamente em Belo Horizonte, não possuímos muitos projetos que permitam o diálogo internacional, nem essa possibilidade de imersão que se apregoava ao mesmo.
Minha surpresa foi maior quando descobri, no primeiro dia, que além dos coordenadores dos laboratórios, teríamos a companhia de diversos outros artistas estrangeiros. Isso expandia a possibilidade do intercâmbio de experiências e relações. Eram eles Admre Kamudzengerere, pintor do Zimbawe, Maryanto Beb, desenhista da Indonésia, Jeannoux van Deijck, pintora da Holanda, Rumiko Hagiwara, artista japonesa e Marteen Sleeuwits, escultor holandês. No começo a relação com esses exemplares de artista importado foi complexa, devido a barreira da língua, mas logo, pelo menos comigo, pude vencê-la, contorná-la através do exercício constante da fala, o que expandiu as possibilidades de trocas e intensificou minha experiência. Considero a troca com todos os participantes, não só como os acima citados, mas também com nossos representantes nacionais – alguns que acabara de conhecer, entre outros que já tivera oportunidade de trabalhar anteriormente –, a maior força do evento, bem como aonde se encontrou a grande fonte de aprendizado do mesmo.
Admre, dentro de nosso grupo, assumiu uma postura questionadora, sempre argumentando e defendendo suas posturas, nos obrigando a estar atento ao diálogo que construíamos, como um coletivo, e a manter uma postura crítica com nossas falas, além de nos fazer ter um cuidado extremo com a tradução de nosso pensamentos em palavras – de um vocabulário estrangeiro. Os embates envolvendo os integrantes e a elaboração do pensamento teórico por trás de nossas decisões, se enriqueceram em muito com essa disputa calcada nas barreiras da linguagem, bem como nas barreiras ao pensamento que cada um expunha aos outros para a validação do nosso fazer.
Maryanto nos presenteou com a visão de um artista, ainda novo, mas já inserido no mercado de seu país e se sustentando através de seu trabalho em arte. As análises comparativas do mercado da Indonésia com o mercado de ações, com altas e quedas, aumento da procura por um artista e desaparecimentos de outros, sustentados pelas concorrências das galerias num país sem museus – que segundo ele são uma forma de estabilizar o preço dos trabalhos ao manterem um artista em sua coleção –, me fez ver como o processo de validação, mercantil, da arte depende dessas instituições, e como o Brasil ainda parece engatinhar nessa questão do mercado, tornando-nos meio infantilizados para lidar com esse aspecto da arte.
Jeannoux, durante as visitas a exposições na cidade, me ajudou a observar os contrastes entre o modo europeu de construção de um trabalho de arte, apresentado-o mais claramente, mais limpo, com conexões menos exageradas, com menos elementos e de maneira mais impessoal. Foi interessante perceber a dificuldade que ela tinha para perceber as relações de escolhas, nas obras, de artistas de Belo Horizonte – como por exemplo Marconi Marques. Quais são as proximidades de um jogo americano com a pintura? Qual a relação das diversas camadas extraídas da mesma? Como a moldura Kitsch e seu lugar de origem entram nessa história? Ou seja o que para nós parecem ser leituras óbvias e claras para eles são exageros truncados, o que me alertou para essa condução do olhar que realizamos, não só como uma diferença no fazer, mas como um labirinto no qual podemos nos perder ou nos achar.
Rumiko e Marteen pareciam a imagem do contraste uma sempre sorridente o outro mais fechado, nossa típica impressão mental dos europeus do norte. Mas ambos me surpreenderam ao apresentarem um jogo de Ping Pong, como proposta do laboratório. O jogo lidava com todas as problemáticas e qualidades dos dois, e serviu como uma plataforma para as pessoas se relacionarem, integrando aqueles que não tiveram muito contato uns com os outros através da estrutura de times. Achei uma forma extremamente divertida de se contornar uma situação de contimento num grupo tão grande – ao todo os participantes dos dois laboratórias somavam umas quarenta pessoas.
Do grupo como um todo ficaria difícil esboçar um relato individual, mas dos encontros na FUNARTE, dos bares e exposições pela cidade, ao jantar em minha casa, cada um deixou suas marcas, algumas como desenhos nas paredes, ou como um apetite voraz, ou como discussões e trocas de palavras pelos corredores, muitas reflexões artísticas, "causos" e piadas mordazes...
Passados três dias de evento nossa orientadora chegou – ela teve problemas com o visto. Assim que realizamos todas as apresentações, espirituosamente, ela propôs uma divisão: pela manhã nos orientaria em pesquisas individuais, à tarde em pesquisas coletivas. Proposta que conciliava e separava...
Pelas manhãs Otobong começou a leitura de nossos portfólios e as conversas, com cada um a parte dos demais, para conseguir entender nossas linhas de pesquisa. Nessa etapa ela ficou muito confusa pois além do meu portfólio apresentar diversos trabalhos diferentes uns dos outros, tanto visualmente, quanto conceitualmente, alguns deles lhe pareciam frutos de uma pesquisa muito extensa, enquanto outros pareciam que não tinham nenhuma preocupação com isso, me alertando que deveria ter cuidado, pois apresentados assim poderiam dar a impressão de "truques". Nesse momento a barreira da língua foi bem intransponível e não consegui traduzir em palavras, como o meu portfólio representa um postura que assumo enquanto artista.
A síntese desse pensamento só veio alguns dias depois na palestra de Branly Lopez, quando nos alertou, através da perspectiva da teoria do caos, que a falta de objetividade não significa a falta de um propósito. Meu portfólio é construído de um maneira a deixar transparecer esse pensamento, apresento diversos trabalhos com os quais privilegio a experimentação, contudo busco fugir da ausência total de um padrão – o que por si só já configuraria um padrão, o do eternamente novo –, criando experiências mais aprofundadas através da persistência paciente em suas questões. Assim não tenho pretensão de fingir objetividade, no meu processo em arte, uma vez que não a vejo como uma marca, ou garantia de qualidade através da disciplina.
Otobong me pediu para apresentá-la a pesquisa individual que estava conduzindo. Como, no momento, ainda não tinha surgido algo específico para a oficina, lhe apresentei a série Pão Nosso de Cada Dia, que são recortes da paisagem urbana, de Belo Horizonte, através de desenhos em papel de pão. Tenho costume de usá-los para esboçar um entendimento das relações que as instituições, – que sediam os eventos artísticos que participo – mantém com o seu espaço interno, assim como as mantidas com o espaço que as circundam. Ao tentar relacionar os recortes de paisagem e colagem dos mesmo às folhas de papel de pão, através do desenho, bem como as relações do título com a religiosidade brasileira, e ao ganha pão, ao alimento que nos sustenta, arte/pão, ela simplesmente não conseguiu ver o que o desenho tinha a ver com a fotografia e insistia que ele não casava com o papel, que o usava como um mero suporte sobre o qual eu não havia depositado muita reflexão em sua especificidade – até concordo que o desenho realmente não comunga com esse suporte, mas a reflexão sobre o mesmo já vêm desde 2007. Por não querer entrar numa discussão sobre a história da fotografia, do processo fotográfico – seus recortes e colagens – como um dos pontos cruciais do modo como a arte contemporânea se realiza, argumento extensamente defendido por Philippe Dubois; além de perceber que ela tinha noção disso, notei que o problema estava relacionado mais as diferenças entre as posturas que eu e ela assumimos para encarar a arte – já relatadas acima quando falei da Jeannoux. Resolvi repensar como lhe apresentar o trabalho e buscar outras opiniões sobre o mesmo.
Fonte: acervo do artista.
CRO, Flávio. Pão Nosso de Cada Dia, 2007 à ..., esferográfica sobre papel de pão e adesivo de
máquina eletrônica, dimensões variadas.
No dia seguinte não pude comparecer, uma vez que tive que me inscrever para um exame de proficiência, na UFMG. Ao chegar no próximo dia, vários de meus colegas no laboratório, me avisaram que Otobong queria falar comigo, que ela estava muito nervosa com a minha falta, pois eu não havia avisado nada, para ela, e que era para conversar com ela sobre isso ou ela iria me expulsar do laboratório – embora tivesse deixado avisado sobre a falta para os colegas do meu grupo. Bem resolvi não ficar nervoso com isso e fiz uma montagem dos meus desenhos em papel de pão, uns 150, no chão da galeria 5, e a avisei que estaria lá pronto para conversar com ela.
Enquanto a aguardava pedi alguma opiniões sobre o trabalho para o Marcos Hill, e uma vez que o trabalho estava no chão, a relação com o espaço se tornava mais clara, bem como os padrões visuais das etiquetas de preços. Ele me disse que o papel como suporte, para o desenho, não o incomodava, ainda que percebesse o que Otobong queria dizer com não ser a melhor escolha para aquele suporte; conversamos bastante sobre a espacialidade, ele me chamou atenção para o ritmo visual das etiquetas, além do conceito de "truque" na arte; de forma que quando Otobong chegou tive muito o que apresentar. Sua primeira impressão foi sobre a espacialidade que o trabalho propunha, algo que ela não tinha conseguido perceber somente com a minha fala, também me apresentou muitas possibilidades de caminhos a partir dessa pesquisa, como relacionar e/ou subverter o preço das etiquetas, criando uma relação entre o preço do produto e o valor da arte, qual seria ele? Não precisava ser apenas o preço estampado nas mesmas, que eu já assumira. Talvez seria o caso de pensar o desenho em outros papéis, como de um perfume e assumir o preço e o nome em sua etiquetas como os do trabalho, etc. Foi bem proveitoso, tanto que no final falou para não me preocupar que não me expulsaria, mas que deveria deixar as pessoas do meu grupo ou ela saberem, caso eu não pudesse estar presente.
Fonte: acervo do artista.
CRO, Flávio. Pão Nosso de Cada Dia, projeto de instalação (no chão) de desenhos de esferográfica
sobre papel de pão e adesivo de máquina eletrônica, dimensão variada.
A partir das reflexões decorrentes de toda essa imersão resolvi experimentar uma ideia advinda da linguagem: espelhar o pronome WE, nós em inglês, em dois espelhos, em ângulo de 90º, refletindo o pronome ME. O espelhamento que o trabalho proporcionaria me lembrava muito a relação que vivíamos no dia a dia, procurando um meio de nos expressarmos com nossos colegas estrangeiros. Ao apresentar a Otobong essa ideia, ela demonstrou muita preocupação com a possibilidade do objeto perfazer-se num "truque", me alertando novamente sobre isso. Sugeriu-me uma pesquisa para me aprofundar nas minhas escolhas, me fazendo questionar qual a fonte da letra que usaria, cor, se seria mais visível ou delicada, o tamanho, tanto da letra como do espelho, com ou sem moldura, etc., além de me sugerir observar artistas como Pistoleto e Dan Grahan, os quais poderia consultar sua proposições com espelhos, como forma de me guiar em minhas escolhas. Conversando com Marcos Hill surgiram os nomes de Rubens Gerchman, Odilon(?), a poesia Concreta e o movimento Neoconcreto; consultando meus colegas de oficina surgiu o nome do Grupo Oulipo e o quase nome de outros artista, além de diversas reflexões sobre as escolhas e decisões sobre como o trabalho deveria ser apresentado.
Essa pesquisa teórica me levou a identificação com os jogos de linguagem do Grupo Oulipo, nos quais estabelecem normas para a criação, de maneira restritiva, a exemplo da minha escolha de uma palavra que, quando espelhada, gera outra; além do movimento Neoconcreto, a exemplo de alguns trabalhos de Rubens Gerchman, nos quais há a transformação da poesia em objeto. Partindo desse caminho optei por não me concentrar apenas nas questões entre o objeto e a linguagem, e como mantenho uma relação muito forte com a paisagem urbana da cidade, após a primeira fase de pesquisa, iniciei outra nos entornos da FUNARTE, com a qual pude descobrir um espelho, e posteriormente descobrir nas cores das placas e letreiros da região, a fonte e a cor da letra que gostaria de assumir no trabalho. O espelho apresentava uma moldura dourada, bem Kitsch, que podia ser associada as molduras clássicas; muitos letreiros da região são em vermelho e amarelo, com letras retas, sem serifas; outra característica marcante é a forte presença masculina, atraída pela oferta de sexo nos prostíbulos e motéis espalhados nos diversos quarteirões. Portanto essas peculiaridades do lugar me desafiaram a assumir uma postura Kitsch com o meu trabalho – algo do qual costumo me distanciar –, pintando o pronome WE com esmalte vermelho sobre o espelho e com a ajuda de uma máscara. Os erros, a sujeira, a poeira e os borrões foram mantidos e o objeto deveria ser exposto na altura de nossos umbigos.
Fonte: acervo do artista.
CRO, Flávio. WEME, 2012, reflexão de pintura com esmalte de unha sobre espelhos de R$ 1,99, 20 x 20 x 15cm.
Para Otobong eu experimentei pouco, embora meu processo mental seja extenso, eu só produzi um objeto, não aproveitei para desdobrá-lo em outros, e me contentei com pouco. Claro que houve limitações de tempo, financeiras, etc., mas realmente achava que esse objeto sintetizava as minhas relações com aquele lugar, durante aquele tempo, também o via como um passo inicial e não o fim da pesquisa, é apenas uma das milhares de outra configurações que poderia assumir, algo que ela concordou e aceitou...
O que realmente me interessou foi essa problematização que ela me expôs, me obrigando a exercitar minha capacidade crítica sobre o meu fazer e sobre o processo no qual me envolvia durante o laboratório. Não acho que ela via no meu trabalho uma tradução do "truque" na arte, percebo seus conselhos mais como formas de enriquecer minha pesquisa, me possibilitando adquirir consciência de minhas escolhas, já que não acho que exista tal coisa como arte sem processo ou mero truque, simplesmente não nos é possível saber o quanto de energia física e mental um artista depositou sobre um trabalho, o que vemos pode ser o resultado de cinco, dez ou quinze anos de estudo, materializados na forma de um trabalho de arte.
Apresentar, levianamente, o processo por trás do desenvolvimento de um trabalho de arte pode contribuir para o problema da coisificação do seu processo, de sua mercantilização, através da transformação em objeto e/ou produto, de seus documentos, registros, etc. Essa criação de um "lastro" para o trabalho através de sua validação crítica, institucional e documental, podem gerar uma espécie de postura processual, um maneirismo, que só fará contribuir para um elitização do fazer na arte. Portanto não se pode ter pressa em julgar algo como "truque", desqualificar ou reduzir um fazer dessa maneira só dá a entender uma preguiça de buscar as relações que algo suscita entre o sujeito, o espaço e o momento no qual se inserem.
Passados alguns dias, do início da oficina, passei a integrar o grupo de política, formado pela própria Otobong, que ficou conhecido como grupo do muro, os integrantes iniciais eram: Admre Kamudzengerere, Flávio CRO, Jairo Pereira, Maíra Fonte Boa, Paulo Rocha, Sarah Vaz e Scheila Silva. Como não me identifiquei com os demais grupos formados, e esse grupo parecia interessado numa aproximação política com o espaço no qual estávamos, acabei me identificando.
Passamos a percorrer o espaço da instituição buscando alguma conexão com o mesmo, mas a cada lugar que visitávamos, que já não tinham sido designados como espaços dos laboratórios em questão, éramos convidados a nos retirar, fato que foi nos causando grande angústia e que gerou diversas discussões e pedidos de autorização, para que os diretores das Instituições: IPHAN e FUNARTE, nos autorizassem a transitar pelos espaços externos de seus terrenos. Todo esse trânsito burocrático nos levou a pensar na imagem do muro, das barricadas, das muralhas, que são erguidas para dificultar os acessos e gerar barreiras aos homens, afastando-os uns dos outros.
Após conseguirmos a última autorização necessária, – podermos deslocar a enorme pilha de paralelepípedos, que se encontrava no espaço do IPHAN, para o espaço da FUANRTE – passamos a discutir sobre a validade de realizar tal prefiguração do trabalho de construção de um muro, decidindo como seria erguido, de qual maneira nos vestiríamos, ou seja as regras gerais da ação. Acabamos por idealizá-lo nos moldes de um trabalho inútil, semelhante ao realizado nos campos de concentração para destroçar o corpo e o espírito dos prisioneiros. Mas toda essas questões geraram grandes embates e problematizações em discussões calorosas, além de um desgaste físico e mental muito elevado, levando alguns integrantes, com mais inclinação com o fazer, a se sentirem angustiados e a deixarem o grupo, sem comunicação prévia, por não acreditarem que as discussões atingiriam algum lugar concreto, outros simplesmente saíram pois não queriam realizar a ação.
Otobong teve que nos comunicar essas saídas pessoalmente e passou a nos questionar a respeito do motivo das pessoas estarem deixando o grupo, bem como sobre nunca saber ao certo o que nós estávamos fazendo, ou aonde íamos, ou o motivo de um integrante não estar presente, durante suas conversas com o grupo, ou nas atividades diárias. Essas arguições eram diárias e no começo nutriam as discussões de nosso grupo, nos fazendo questionar o nosso fazer a partir do ponto de vista de nossa orientadora, mas com o tempo, a relação foi se desgastando, se tornando pedante e gerando um clima de animosidade mútuo. Argumentávamos que as pessoas tinham o direito de ir e vir a seu bel prazer e ela sustentava que não agíamos como um grupo. Por fim a imagem do muro começou a se prefigurar nas relações de nosso grupo e a ideia, de construir e desconstruir um muro, se tornava cada vez mais metaforizada em nossa situação de grupo, manter-se nesse e manter esse grupo era cada vez mais uma questão de erguer e desmontar barreiras, ou seja política.
Mesmo quando os dois laboratórios de juntaram e Vaughn se juntou a Otobong, num esforço descomunal, para a apreciação crítica dos trabalhos de todos os integrantes do evento, – um adendo: seria interessante limitar em dez o número de participantes para cada laboratório, evitando o desgaste de todos – o clima de animosidades continuou. Parecia que para ela a desistência daquelas pessoas, de fazer um trabalho, automaticamente as excluía do convívio em nossas vidas, de nosso círculo de amizade, ou da possibilidade de trabalharmos juntos novamente, o que seria uma falácia, pois essas desavenças se referem a um momento específico e não são algo para servir de impedimento para uma reunião futura. Mas mesmo com esse clima ambos orientadores compraram nossa ideia, insistiram nas discussões e se doaram a elas, bem como aos demais participantes do evento, se desdobrando em discussões e no pensamento sobre o fazer de cada um para integrá-los ao todo. Um esforço árduo e notável.
Fonte: Clarice Cyrino.
CRO, Flávio; et al. Muro, 2012, intervenção/ação, construção e desconstrução de um muro de pedras até a exaustão, sem falar, beber água, comer, ir ao banheiro ou parar para descansar e caso deixássemos a ação não poderíamos retornar, FUNARTE, Belo Horizonte.
Duração: 9hs; 40 segundos para colocar e/ou retirar cada pedra.
Dimensão: 4 x 1,70m; 13 fileiras de 42 pedras.
Pedras movidas para a construção = 546; para a desconstrução = 254; TOTAL = 800.
Peso de cada pedra = 5Kg; totalizando 4.000Kg movidos.
Passos para colocar ou retirar cada pedra = 200; totalizando: 160.000 passos.
Distância percorrida para colocar e/ou retirar cada pedra = 100m; Totalizando um deslocamento de 80.000m ou 80Km.
Números individuais:
Média de 3 min para cada participante colocar e/ou retirar uma pedra. (Se realizada por uma única pessoa o deslocamento das 800 pedras levaria 2.400min, ou 40hs.)
O último participante a deixar a ação carregou 200 pedras, 1000kg, deu 40.000 passos e percorreu 20kms, em 9hs.
O penúltimo participante carregou 180 pedras, 900kg , deu 36.000 passos e percorreu 18km em 8,5hs.
O antepenúltimo carregou 150 pedras, 750kg, deu 30.000 passos e percorreu 15km em 7,5hs.
O terceiro carregou 120 pedras, 600kg, deu 24.000 passos e percorreu 12km em 6,5hs.
O segundo carregou 94 pedras, 470 kg, deu 18.800 passos e percorreu 9,4km em 4hs.
O primeiro carregou 56 pedras, 280kg, deu 11.200 passos e percorreu 5,6km em 2,5hs.
A partir do debate:
Tudo isso gerou um atitude de rebater ou de cortar respostas, levada até mesmo para o espaço de debates dos trabalhos, que para mim infantilizou a discussão, deslocando-a e concentrando-a em problemas que se mostraram confusos quando compartilhados publicamente. Mas toda atitude têm seus pontos favoráveis e desfavoráveis, espero que mesmo os aqui apresentados contribuíram para o engrandecimento dessa experiência, e que estejamos subestimando o poder dessas dissensões, pois o evento pode ter sido absurdamente frutífero graças as mesmas.
Todos que se inscreveram para estar ali foi por interesse, mas isso não quer dizer acordar com tudo que é posto, mas também propiciar escapes, mesmo que não autorizados – é muito fácil esgotar-se dedicando até 13hs do seu dia, repetidamente, em prol de um trabalho. Para mim é complicado essa postura do artista, representante dessa elite cultural e/ou intelectual brasileira, ou como um pacificador ou criador de consensos, prefiro exercer uma postura crítica que nem sempre será conciliadora diante das posturas de uma determinada proposta, pois através do dissenso, provocado pela problematização da mesma, fazemos emergir um processo de discursividade sobre a experiência, sem que essa atitude combativa gere inimizades.
Há, ainda, essa mistura de mito e preconceito de que performar algo é interpretar e, consequentemente, não é "real". Para quem ela é mais real? Para os que a vivenciam no instante de seu acontecimento? Para queles que a praticaram? Para os que a observaram? Ou para alguns que a experimentaram através de documentos que se distanciam dela no tempo? Enquanto ficção devemos analisar como a mesma se faz presente na realidade a qual experimentamos. É preciso cuidado ao requisitar alguma autoridade sobre a experiência, uma vez que não existe ordem de superioridade nas diversas formas da mesma. Todas essas situações estabelecem uma relação diferente que não podem ser superestimadas às outras, portanto devem ser analisadas por uma ótica crítica perspectivista, dialógica aos pontos apresentados.
Desejos sinceros para que essas inciativas e espaços
para troca se mantenham e disseminem-se.
Flávio CRO
Fotografias: Clarice Cyrino.
CRO, Flávio; et al. Muro, 2012, intervenção/ação, construção e desconstrução de um muro de pedras até a exaustão, sem falar, beber água, comer, ir ao banheiro ou parar para descansar e caso deixássemos a ação não poderíamos retornar, FUNARTE, Belo Horizonte, 9hs de duração, 4 x 1,70m.
Estética da transformação capilar de Deise Oliveira!
Enceramento do evento Permeabilidades do CEIA
Mostra dos processos artísticos realizadas no laboratório permeabilidades, organizado pelo CEIA, na Funarte, Casa do Conde.
Mostra dos processos artísticos realizadas no laboratório permeabilidades, organizado pelo CEIA, na Funarte, Casa do Conde. Desmontagem coletiva do Muro.
Mostra dos processos artísticos realizadas no laboratório permeabilidades, organizado pelo CEIA, na Funarte, Casa do Conde. Quase toda a turma...
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